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Portos brasileiros buscam pistas para reduzir riscos climáticos

Com a pior seca em quase 100 anos no Brasil, portos e reguladores intensificam os esforços para quantificar os riscos relacionados à mudança climática para os centros marítimos do país.

A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) e a Agência de Cooperação Técnica Alemã (GIZ) estão compilando classificações para riscos que variam de vendavais à elevação do nível do mar em 21 portos brasileiros. Os dados da primeira fase serão divulgados no próximo mês. As operações marítimas do Brasil movimentam os maiores volumes mundiais de café, soja e açúcar.

“A carência d dados ainda é a maior dificuldade que existe para a compreensão da vulnerabilidade das regiões portuárias brasileiras frente às mudanças climáticas”, disse em entrevista Alessandro Max Bearzi, especialista em regulamentação ambiental da ANTAQ.

Uma segunda fase do estudo analisará se as ameaças têm se tornado mais frequentes e qual seria o impacto no futuro.

As hidrovias da América do Sul não foram poupadas do clima adverso que atinge outras regiões do mundo. Os rios na região norte da Amazônia subiram para níveis recordes, enquanto ao sul estão mais rasos devido à seca, dificultando o transporte de commodities para os portos e até mesmo a geração de energia.

Os portos costeiros do Brasil também enfrentaram desafios climáticos, incluindo ciclones, mas atualmente movimentam mais mercadorias conforme a demanda por commodities do país continua crescendo.

A ANTAQ estima que os mais de 200 terminais marítimos do país vão aumentar os embarques em 4% neste ano, superando 1,2 bilhão de toneladas, um volume recorde.

Porto de Santos, o maior da América Latina, continua batendo recordes, e é um dos três portos escolhidos pela agência para a segunda fase do estudo.

Embora a cidade de Santos não tenha experimentado nenhum contratempo relacionado ao clima, trabalha com a ANTAQ e coleta dados para avaliar os efeitos do clima adverso, disse Thiago Menezes, supervisor ambiental da Santos Port Authority (SPA). “Entendemos que é importante conhecer bastante a respeito”, disse.

Outra avaliação envolvendo pesquisadores do King’s College London e do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) estimou que o nível do mar em Santos poderia subir 45 centímetros até 2100, e a cidade poderia enfrentar perdas cumulativas de até US$ 467 milhões no período, segundo o estudo de 2017.

“Nosso valor [estimado] poderia ser multiplicado por três”, disse em entrevista o climatologista da Cemaden, José Marengo, principal pesquisador do projeto no Brasil. “Alguns falaram que nosso trabalho foi muito conservador. As perdas econômicas eram baseadas somente no valor da propriedade.”

Como consequência do projeto, a cidade de Santos elaborou um plano para enfrentar a mudança climática e outro para abordar a elevação do nível do mar, disse Marengo.

O Porto de Santos é mais protegido geograficamente que o centro urbano e, portanto, menos exposto a tempestades e marés, segundo Menezes.

Ciclone surpresa

No Porto de Paranaguá, o segundo mais movimentado do Brasil, a administração do porto foi alertada depois que um ciclone subtropical sem precedentes atingiu o terminal em 2020, disse Thales Trevisan, gerente ambiental do porto.

“Esse tipo de ciclone não é familiar na região, foi inesperado”, disse Trevisan sobre o impacto do evento climático no porto. Em resposta, a administração instalou uma estação meteorológica em tempo real que permite aos operadores reagir de forma mais rápida e eficaz a eventos climáticos extremos, como o aumento da velocidade do vento e tempestades, acrescentou Trevisan.

“Se outro ciclone viesse, a gente já paralisaria a operação”, disse em entrevista.

Nos dias em que fica fechado, o porto, que movimentou 52,1 milhões de toneladas em 2020, perde cerca de R$ 1 milhão, portanto, a preparação para possíveis mudanças no clima é fundamental, disse Trevisan.

O Porto de Rio Grande, maior exportador de soja depois de Santos, também está na segunda fase de estudos da ANTAQ. O governo do Rio Grande do Sul quer uma perspectiva mais clara de como a maior ocorrência de eventos extremos, como ventos e tempestades, vai se desenrolar no longo prazo, disse Henrique Ilha, que supervisiona iniciativas ambientais na autoridade marítima do estado.

“Nossa costa é propensa a eventos de grande magnitude, mas, nos últimos três ou quatro anos, houve eventos que foram além e afetaram a costa de uma forma que não voltou a ser o que era”, disse. “Precisamos de um intervalo de dados mais amplo para confirmar se isso é um problema.”

Para abordar essas vulnerabilidades e lacunas, o porto fechou uma parceria com o SiMCosta, um projeto de monitoramento com sede no Rio Grande, cujos pesquisadores instalaram boias em toda a costa brasileira desde 2014 para fornecer medições meteorológicas e oceanográficas aos portos do país.

Décadas de dados são necessárias para entender o impacto da mudança climática nos portos, mas “o Brasil não tem décadas”, disse Carlos Alberto Garcia, fundador do SiMCosta.

Natalia Pereira, cuja empresa fornece monitoramento meteorológico para terminais privados em Rio Grande, disse que a velocidade dos ventos na região aumentou 10% nos últimos dois anos.

“Estamos percebendo mudanças”, disse a executiva, CEO da Catavento Meteorologia. “Não são mais previsões. Em 50 anos, os portos também perceberão essas mudanças.”

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